Rui Lopes, Vinícola Encosta do Sobral
Conversamos com o simpático enólogo português Rui Lopes. Foi uma agradável oportunidade para aprender mais sobre o vasto mundo da viticultura portuguesa. Rui produz vinhos excepcionais em regiões como o Douro, o Dão, o Alentejo e o Tejo, o antigo Ribatejo
Para o mercado do vinho, o Tejo pode soar como algo novo, mas lá se produz vinho desde 2.000 anos antes de Cristo. Experimentamos alguns vinhos impecáveis que Rui produz nessa interessante região. Sempre muito gentil e acessível, Rui nos apresentou o tinto ENCOSTA DO SOBRAL VINHAS VELHAS, que ele produz no Tejo.
*PORTUGAL JÁ REMOVEU GRANDE PARTE DE SUAS VINHAS VELHAS. COMO VC VÊ ESSA QUESTÃO?*
A viabilidade econômica sobrepõe-se à conservação. Se um vinho não consegue ser vendido a um preço compatível com os custos de manutenção de vinhas velhas, não há como mantê-las. Em uma vinha velha, tudo tem de ser feito manualmente. A mão de obra é maior, não há possibilidade de mecanização, o rendimento das videiras é menor e, portanto, elas vêm sendo irreversivelmente substituídas por vinhas novas, que produzem mais, são mais fáceis e menos custosas para cuidar. As vinhas velhas que ainda existem são aquelas cujos produtores conseguem repassar às garrafas o alto custo de sua preservação.
*VOCÊ PRODUZ VINHOS EM DISTINTAS E IMPORTANTES REGIÕES DE PORTUGAL. QUE DIFERENCIAL VOCÊ VÊ NO TEJO?*
O Tejo tem muita diversidade, é uma região muito completa, promissora e de grande futuro. Há solos no Tejo que permitem grande produtividade, possibilitando a produção, por exemplo de uma gama de vinhos de entrada com volume e ótima qualidade. Temos o Rio Tejo, que exerce forte influência positiva no clima da região e, ainda, uma característica muito específica e altamente estratégica: a neblina, que contribui decisivamente para preservar a acidez das uvas, permitindo a produção de vinhos de excelente qualidade.
*PORTUGAL SEMPRE FOI UM PAÍS MUITO CONHECIDO PELOS VINHOS DE CORTE, OU SEJA, ELABORADOS COM VÁRIAS UVAS. É CORRETO AFIRMAR QUE CRESCE A IMPORTÂNCIA DOS VARIETAIS, VINHOS PRODUZIDOS COM UMA SÓ VARIEDADE?*
Corretíssimo. Estamos num mundo cada vez mais global e é muito mais fácil, por exemplo, vender vinhos em mercados muito importantes como os USA e Canadá, que são muito focados nas castas, muito mais que em blends. São consumidores que valorizam muito os vinhos produzidos com uma só variedade. Produzir vinhos monovarietais é também uma estratégia importante para as pessoas entenderem e valorizarem as uvas nativas de Portugal.
*PORTUGAL SEMPRE DEU GRANDE IMPORTÂNCIA ÀS SUAS UVAS NATIVAS. COMO VOCÊ VÊ A CRESCENTE PARTICIPAÇÃO DAS UVAS INTERNACIONAIS?*
Temos de nos adaptar e reconhecer que são grandes castas de uvas e que, apesar de não serem nossas, não há um enólogo capaz de afirmar que um Syrah, Sauvignon Blanc, Chardonnay ou Cabernet Sauvignon sejam variedades ruins. São uvas que entregam uma qualidade excepcional e temos de aceitar isso com naturalidade – mas claro, sempre defendendo as nossas uvas locais. A uva Syrah, por exemplo, desempenha um papel de crescente relevância no Alentejo, com vinhos cada vez melhores. O Sauvignon Blanc é cada vez mais plantado na Costa Atlântica, contribuindo com um frescor incrível. Tudo isso ajuda a comunicar o que é Portugal, pois se as castas não são conhecidas, é mais difícil comunicar as regiões. Por tudo isso, esse balanço vai acontecer, é inevitável.
*SE VOCÊ TIVESSE DE CULTIVAR E VINIFICAR SOMENTE UMA VARIEDADE BRANCA E UMA TINTA, QUAIS SERIAM AS SUAS ESCOLHAS E PORQUÊ?*
A escolha dependeria muito da região, mas respondendo de forma direta, uma vez que a pergunta foi direta, eu escolheria a variedade branca Arinto e a tinta Touriga Nacional. Arinto porque é uma variedade incrível, que dá aos vinhos um frescor excepcional, é aromática e com grande potencial de guarda. E a Touriga Nacional porque é uma uva também excepcional, que rende vinhos muito frutados, tem uma plasticidade que permite produzir vinhos muito variados e representa perfeitamente a viticultura e a enologia de Portugal.